quinta-feira, 8 de maio de 2008

O Parto

Juliano Flávio

Então sentava a menina
e escondia seu ventre de todos

atravessava correndo a sala de visitas
não olhava para o lado
acenava para seu pai
depois recolhia-se no quarto
o pai comentava:
essa menina tão apressada
nunca olha direito por onde anda
qualquer dia se espatifa no chão

como esconder os frutos das árvores?
menina esperta fingia a sua não existência
repleta de segredos

trancava-se horas no banho
era seu reduto em que nua
via sua realidade

A mãe sempre entretida
com os caprichos do pai
não se importava com sua concorrente
Sôfrega, desistia de olhar o óbvio

Seus pais tomados pela cegueira
não se afligiam com a menina
Vá brincar com sua prima
Achavam-na muito reclusa

Um dia ao acordar
sintiu um líquido
correm todos ao hospital
Doutor o quê tem minha filha?
O que tem ou o que está tendo?
Como assim?
Sua filha está tendo um parto.

Assim venceu a menina
passeando sobre seus pais
nada lhes ofereceu de pista
nem uma dica de seu rebento
substantivo abstrato
que de tão abstrato sumiu
em meio a tantos substantivos,
tantas preocupações e visitas constantes:

É o moço que vende enciclopédias
outras vezes a vizinha que pede um pouco de açúcar
O caminhão de gás, o homem da luz,
O entregador de pizza
Depois é levar a filha mais nova na escola
Tantos esclarecimentos a dar para o marido
e o marido à mulher

Não se via o crescimento,
o rebento que iria rebentar.
o parto se deu
o menino cresceu
e a menina continuava
a esconder suas ternuras
e seus caprichos
parece que nada havia acontecido.

Um comentário:

Fabi disse...

Gostei.
Adoro a história.